Justiça suspende edital da UFPE que previa turma de Medicina exclusiva para sem-terra e quilombolas
01/10/2025
(Foto: Reprodução) Prédio do curso de medicina do Centro Acadêmico do Agreste (CAA) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em Caruaru
Ascom UFPE/Divulgação
A Justiça Federal em Pernambuco suspendeu, por decisão liminar, o edital nº 31/2025 do Centro Acadêmico do Agreste (CAA), da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em Caruaru, no Agreste de Pernambuco, que previa a criação de uma turma de Medicina destinada exclusivamente a 80 integrantes de assentamentos da reforma agrária e comunidades quilombolas.
A decisão foi tomada pelo juiz federal Ubiratan de Couto Maurício, em ação popular movida pelo vereador do Recife Tadeu Calheiros (MDB). O magistrado entendeu que a universidade não poderia criar vagas fora das hipóteses previstas em lei, ao reservar todo o processo seletivo a um público específico.
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“O acesso aos cursos de graduação, distintos da ampla concorrência, são somente os das hipóteses taxativamente previstas em lei (…). A instituição pública que ampliá-las age à margem da lei, ilegalmente”, destacou o juiz na decisão acessa pelo g1.
Na ação, Tadeu Calheiros alegou que a medida feria os princípios da igualdade, da impessoalidade e da moralidade administrativa. O vereador disse não ser contrário a políticas afirmativas, mas criticou a forma como o edital foi estruturado.
“A Justiça reconheceu que o edital não respeitava os princípios da igualdade de oportunidades. Não se trata de negar ações afirmativas, mas de exigir equilíbrio, transparência e rigor na seleção de futuros médicos”, afirmou.
O que dizia o edital
Publicado em 10 de setembro, o edital do processo seletivo reservava todas as vagas da turma do curso de Medicina do Centro Acadêmico do Agreste para beneficiários do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera).
O Pronera existe desde 1998 e oferece cursos em áreas como pedagogia, direito, agronomia, engenharia agrícola, medicina veterinária e zootecnia. Pela primeira vez, a política pública previa uma turma de Medicina.
Poderiam concorrer assentados, acampados cadastrados pelo Incra, quilombolas, educadores do campo, egressos de cursos promovidos pelo instituto e participantes do Programa Nacional de Crédito Fundiário.
Repercussões
A iniciativa recebeu apoio e críticas. Entidades médicas, como o Conselho Regional de Medicina de Pernambuco (Cremepe), o Sindicato dos Médicos, a Associação Médica de Pernambuco e a Academia Pernambucana de Medicina, se manifestaram contra o processo seletivo.
"A criação de um processo seletivo exclusivo, paralelo ao sistema nacional, sem utilização do Enem e do Sisu [Sistema de Seleção Unificada] como critérios de acesso, afronta os princípios da isonomia e do acesso universal, além de comprometer a credibilidade acadêmica e representar um precedente grave e perigoso para a educação médica no Brasil", afirmaram em nota.
Na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), deputados da oposição afirmaram que o edital era inconstitucional e prometiam acionar a Justiça. Já parlamentares da base do governo federal defenderam a proposta.
Em reunião ordinária realizada na Alepe nesse terça-feira (30), o deputado João Paulo (PT) elogiou a iniciativa da universidade, classificando-a como política de inclusão.
“É o racismo de classe que ainda persiste em parte da sociedade brasileira e que se manifesta quando o pobre, o negro, o camponês ou o indígena usam o que antes era reservado às classes dominantes”, disse.
A deputada Dani Portela (PSOL) também saiu em defesa da medida, ressaltando que a contestação só surgiu quando a proposta passou a envolver o curso de Medicina.
Segundo ela, “enquanto os cursos eram de licenciatura e ou técnicos, não houve contestação”.
A decisão judicial suspende o edital até o julgamento definitivo da ação popular. Procurada pelo g1, a UFPE informou que vai recorrer em todas as instâncias.
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